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TEDxFlandersSalon - Sadettin Kirmiziyuz - Hadj, uma história do caminho sagrado

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    Boa noite, senhoras e senhores.
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    Meu nome é Sadettin Kirmiziyüz.
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    Eu sou um agnóstico assimilado, filho de imigrante,
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    mas, meu nome Sadettin quer dizer 'Alegria da fé'.
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    Fui convidado a dar uma pequena explanação
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    sobre a peregrinação que eu e meu pai fizemos a Meca em 2010.
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    Para isto eu tenho 18 minutos.
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    Tentarei manter-me no tempo.
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    Vou tentar levá-los
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    aos rituais que realizamos durante a peregrinação.
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    Para onde devo apontar?
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    Ok. Você se inscreve para o hadj no site Hollanda Diyanet Vakfi.
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    Para os belgas, existe o Belgica Diyanet Vakfi,
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    mas eu fico com a versão holandesa.
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    Ela é a afiliada holandesa do departamento turco da
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    Presidência para Assuntos Religiosos.
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    Foi fundada em 1923, após a abdicação de
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    Mustafa Kemal Atatürk como califa.
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    Para deixar claro, o califa era o Papa do islamismo.
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    Você se inscreve aqui.
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    Paga 3500 euros, incluido
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    o blihete aéreo, visto, alojamento em hotel por quatro semanas
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    e esta
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    bolsa-hadji.
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    Este é o kit de sobrevivência.
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    Tem de tudo nele:
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    informações práticas e complementares, fotos, chinelos,
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    sabonete sem cheiro, toalhas de mão,
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    o ihram, que é uma veste branca
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    que você usa quando está em estado sagrado,
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    e este livro de preces.
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    Você a mantém segura.
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    Você toma vacina contra malária, estreptococos, difteria, hepatite, meningite,
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    hepatite A, B, pólio, tudo,
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    envia sua carteira de vacinação e seu passaporte
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    para a Presidência de Assuntos Religiosos,
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    e pronto!
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    Que Deus aceite a sua peregrinação e que tudo saia bem para você!
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    Para os muçulmanos, hadji é o ponto alto da sua vida religiosa.
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    Para celebrar, no aeroporto de Amsterdã, no meu caso,
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    milhares de familiares felizes vem se despedir da centena de peregrinos.
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    Há uma prece conjunta,
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    para que a viagem seja abençoada,
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    e para os que ficam há uma solene promessa
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    que haverá muitas preces para eles
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    na casa de Deus, Baitullah, o Ka'aba.
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    Eu estava no aeroporto de Amsterdã,
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    onde milhares de familiares felizes se despediram
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    de centenas de hadjis,
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    e ao lado estava minha namorada
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    de civilização judaico-cristã.
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    Estávamos todos lá,
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    o líder islâmico que nos acompanharia, começou a rezar.
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    Eu disse agnóstico, foi o que eu disse,
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    mas, naturalmente, entendo que é uma jornada séria
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    Então, elevei minhas mãos para rezar,
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    e percebi que minha namorada, com quem coabitava por sete anos,
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    nunca havia me visto rezar em todos esses anos.
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    Doeu? Talvez.
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    O que mais doeu foi o fato de que a prece era
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    desconhecida para mim.
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    Por isso, eu fiz um playback.
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    Em Istambul entramos no Ihram.
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    É assim que chamamos a veste.
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    O estado sagrado leva o mesmo nome.
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    Sou suspeito para falar, mas aqui está um hadji.
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    Meu pai me ajudou.
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    Para vesti-la, não tem outro jeito.
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    Você não consegue vesti-la sozinho, precisa de ajuda.
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    Eu usei um cinto,
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    que precisou de um furo a mais,
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    porque, segundo meu pai, eu
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    sou magro devido ao cigarro.
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    Por isso eu tinha que rezar em Meca para que Alá me ajudasse a parar de fumar.
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    Minha reação foi: "Você acha mesmo que
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    Alá vai me ajudar a parar de fumar?
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    Acha isso mesmo?"
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    E ele respondeu secamente: "Claro. Se você pedir, Ele vai ajudá-lo."
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    Você coloca uma veste na cintura e outra nos ombros
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    e a partir daí, as restrições de estado sagrado começam a vigorar.
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    As restrições são:
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    não pode: cortar unhas, cortar o cabelo, barbear, coçar machucado,
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    usar perfume, praguejar, reclamar, brigar,
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    usar roupa íntima, matar seres vivos e nada de sexo.
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    Não pode falar sobre sexo
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    ou pensar sobre sexo,
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    por quatro semanas.
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    Qualquer violação a uma dessas restrições traz penalidades,
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    não apenas espirituais, mas também materiais.
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    Pense em algo como um pequeno presente para os pobres.
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    No avião de Istambul para Jidá -
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    Não posso mostrar Jidá, mas fica na costa oeste,
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    Jidá fica no Mar Vermelho --
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    no avião há de novo uma prece conjunta.
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    A mesinha dobrável a sua frente é usada para descansar a testa
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    e nesse momento é entoado o talbiya,
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    que é uma prece especial para a peregrinação.
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    Labbayka, Allahumma Labbayk! Labbayka La Shareeka.
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    Não há hadjis no teatro?
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    Bom, quer dizer:
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    "Aqui estou eu, Deus, aqui estou eu,
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    era para eu estar aqui.
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    Ao Senhor, a honra e a glória."
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    Mas quando um hadji entoa
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    o Talbiya, os outros o acompanham.
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    Pode acontecer de você estar no ônibus
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    de Jidá a Meca, por quatro horas e meia no deserto,
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    e estar quase dormindo,
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    quando acontece do hadji atrás de você começar:
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    Labbayk, Allahumma Labbayk! Labbayka La Shareeka.
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    Então você o acompanha.
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    Você tem que se acostumar, mas acredite: você se acostuma.
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    Chegamos a Meca.
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    Vamos direto à parte sagrada da cidade.
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    Você não vê a cidade de Meca nessas quatro semanas.
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    Isto é uma réplica do Big Ben.
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    Foi construído lá.
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    Meu pai me disse que no Big Ben está escrito Alá.
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    Eu achei bem bonito.
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    Você se registra no hotel e naquele momento sua dupla nacionalidade não é mais válida.
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    Você não é mais um marroquino-belga ou um turco-holandês
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    não, você é marroquino ou turco. Pronto.
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    Prosseguindo.
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    Para Masjid al-Haram, a mesquita sagrada,
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    pois lá está o Ka'aba.
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    Aliás, Ka'aba significa "cubo".
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    O que me chamou a atenção foi a arquitetura,
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    não a altura dos minaretes
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    ou das cúpulas, ou a beleza dos ornamentos,
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    mas o fato de que o arquiteto levou em conta
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    o suspense que existe antes do primeiro olhar
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    para o Ka'aba.
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    Primeiro você anda ao redor dos muros.
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    É uma caminhada de 500-600 metros.
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    Mas você sabe que o Ka'aba está lá. Você sente.
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    Fora tem muitos hadjis rezando em sua direção.
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    Você vai chegando perto.
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    Chega ao portão 11.
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    Tira os chinelos, que vão para um saco plástico, e este na mochila,
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    e então - espanto
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    porque não me senti como pensei que fosse me sentir.
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    Para deixar claro, não é que não tenha sentido nada.
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    Foi diferente.
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    Em casa, em Amsterdã,
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    eu escutei muito Oum Kalsoum,
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    Fairuz, música sufi, o Réquiem de Verdi,
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    eu aumentava o volume e pensava:
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    vou me sentir exatamente assim,
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    mas não foi assim.
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    Não senti nada parecido com o que haviam me contado.
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    Meu pai, no ônibus para Masjid al-Haram:
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    "O Ka'aba é um imã e nós somos pedacinhos de ferro."
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    Ou minha mãe que falava com os olhos cheios de lágrimas
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    ou minhas tias, que diziam ser indescritível.
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    Mas o espanto - porque eu faço piadas,
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    e digo 'agnóstico',
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    eu flerto com o ateísmo, talvez,
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    mas não fui sempre assim.
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    Em cada casa que fui quando criança,
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    em cada família, havia uma foto,
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    essa foto talvez.
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    Eu andei com um frio na barriga,
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    nesse furacão branco recheado de gente,
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    que bombeava este coração negro pulsante,
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    acima de mim, a lua e estrelas,
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    Alá no Big Ben,
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    eu senti a lua e as estrelas, Deus no Big Ben,
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    e o coração negro pulsante.
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    Aqui fazemos o primeiro ritual:
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    o tawaaf, a procissão.
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    Como os planetas ao redor do sol, a lua ao redor da Terra,
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    assim faziam as pessoas ao redor de Deus.
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    Nós andamos ao redor por sete vezes, em sentido anti-horário.
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    Ao mesmo tempo recitamos as preces do livrinho,
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    para cada volta uma prece,
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    e depois das sete voltas, nós realizamos uma prece especial
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    para fechar o tawaaf. Masha Alá, parabéns, você realizou o tawaaf.
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    Prosseguindo, tenho ainda 9 minutos.
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    Vamos para o próximo ritual, o sa'i.
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    O sa'i é uma caminhada entre dois montes,
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    Seffa e Merveh, atualmente situados no complexo de Masjid al-Haram.
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    Isso é uma reconstrução, tudo é uma reconstrução.
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    Na verdade, é uma grande peça de teatro que se faz,
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    é a reconstrução da história de Ibrahim, Abraão, Ibrahim --
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    que sob o comando de Deus, enviou sua mulher, Hagar, e seu filho, Ismael, para o deserto.
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    Eles chegam ao local, a Meca.
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    Ela entende bem que eles não vão sobreviver,
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    procura água,
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    ela está no topo do monte e deixa seu filho,
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    porque não tem mais força para carregá-lo
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    e anda até o outro monte.
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    Ela encontra um desfiladeiro que precisa cruzar
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    para alcançar o outro monte.
  • 9:54 - 9:55
    Ela desce,
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    chega ao fundo do desfiladeiro,
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    entra em pânico, porque não consegue ver seu filho.
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    Então, corre para o outro lado, sobe,
  • 10:01 - 10:05
    vê seu filho, ele está bem, graças a Deus,
  • 10:05 - 10:07
    olha em volta, não vê nada, retorna
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    até o desfiladeiro, entra em pânico, corre, vai até o bebê Ismael.
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    Ela faz isso sete vezes.
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    Na sétima vez ela está a ponto de desistir
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    quando parece que Deus não a esqueceu.
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    Um anjo desce do céu,
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    e com a ponta das asas, faz um buraco no chão.
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    Do buraco sai água, a fonte de Zamzam.
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    Aquele local do desfiladeiro
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    está agora sinalizado com lâmpadas verdes.
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    Isto quer dizer que quando os peregrinos passam pela lâmpada verde,
  • 10:38 - 10:40
    eles correm para o próximo desfiladeiro.
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    É uma reconstrução.
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    A fonte de Zamzam ainda jorra.
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    O que os sauditas fizeram? Muito inteligente:
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    eles conectaram a fonte em um sistema complexo
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    de bombas, tubulações, caldeiras, espalhado por todo complexo de Masjid al-Haram,
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    e você pode beber água Zamzam o dia todo. Delícia.
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    Prosseguindo.
  • 11:01 - 11:06
    Temos ainda dez dias para ir a Masjid al-Haram, sempre que possível.
  • 11:06 - 11:07
    Você vai à noite.
  • 11:07 - 11:09
    Durante o dia é muito quente, 40 graus.
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    Você descansa durante o dia. Nós vamos à noite.
  • 11:11 - 11:13
    Você vai em um ônibus especial,
  • 11:13 - 11:15
    que o leva a Masjid.
  • 11:15 - 11:17
    Lá você faz o tawaaf dois, três, quatro, cinco,
  • 11:17 - 11:20
    mas sobretudo: você reza tanto quanto possível.
  • 11:20 - 11:21
    Reza, reza, reza, reza, reza.
  • 11:21 - 11:23
    E não de joelhos, Amado Senhor Deus,
  • 11:23 - 11:25
    não, o salat, o exercício físico.
  • 11:25 - 11:30
    Porque uma oração em Masjid al-Haram, senhoras e senhores, conta por mil.
  • 11:30 - 11:34
    Em quatro semanas que estive na Árabia Saudita,
  • 11:34 - 11:39
    rezei 247 vezes, e dessas, 120 foram em Masjid al-Haram.
  • 11:39 - 11:42
    Multipliquem por mil.
  • 11:42 - 11:46
    Nada ruim para um agnóstico assimilado, filho de imigrante, não é?
  • 11:46 - 11:51
    Depois de dez dias, vamos a planície de Arafat.
  • 11:51 - 11:52
    Número quatro.
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    Lá nos tornamos oficialmente hadji.
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    Maomé fez seu último sermão aqui
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    e todos os peregrinos que vão a Árabia Saudita,
  • 11:58 - 12:00
    encontram-se nessa planície.
  • 12:00 - 12:02
    São 5,5 milhões de pessoas.
  • 12:02 - 12:04
    Nós pernoitamos em tendas,
  • 12:04 - 12:06
    homens e mulheres em separado,
  • 12:06 - 12:09
    está quente, abafado
  • 12:09 - 12:13
    e cheio de mosquitos,
  • 12:13 - 12:15
    os quais você não pode matar
  • 12:15 - 12:18
    e nem reclamar.
  • 12:18 - 12:19
    Na manhã seguinte, existe um serviço de oração
  • 12:19 - 12:21
    de 5 horas e meia,
  • 12:21 - 12:22
    em louvor a Deus.
  • 12:22 - 12:23
    Houve cantos
  • 12:23 - 12:28
    e no fim do serviço, você cumprimenta os outros:
  • 12:28 - 12:31
    Masha Alá, você se tornou um hadji.
  • 12:31 - 12:33
    Mas ainda não acabou, estamos apenas no meio.
  • 12:33 - 12:36
    Vamos logo para o número 5, conhecido como Mozdalefah.
  • 12:36 - 12:37
    Lá vamos recolher pedras
  • 12:37 - 12:39
    para a parte que eu acho mais espetacular:
  • 12:39 - 12:42
    o apedrejamento do diabo.
  • 12:42 - 12:45
    Você recolhe 49 pedras. Cada uma simboliza um pecado.
  • 12:45 - 12:47
    Um defeito, que você quer se livrar.
  • 12:47 - 12:50
    As pedras não podem ser menores do que um grão de bico
  • 12:50 - 12:52
    e nem maiores do que uma noz.
  • 12:52 - 12:57
    Eu recolhi 49 pedras e estava pronto no ponto 5, com meu pai,
  • 12:57 - 12:59
    para ir ao ponto 6, Mina,
  • 12:59 - 13:02
    onde há três grandes pilares que simbolizam o diabo.
  • 13:02 - 13:03
    Estávamos esperando.
  • 13:03 - 13:06
    Por algum motivo, as autoridades sauditas decidiram
  • 13:06 - 13:10
    que todos os 140.000 hadjis turcos presentes naquele momento
  • 13:10 - 13:13
    tinham que se juntar em uma área
  • 13:13 - 13:16
    com cercas temporárias
  • 13:16 - 13:20
    que usamos aqui também.
  • 13:20 - 13:22
    Eram de uns 4 metros.
  • 13:22 - 13:26
    Aqui havia um portão que estava fechado.
  • 13:26 - 13:27
    Ficamos em frente ao portão.
  • 13:27 - 13:29
    Ao longo do terreno havia uma estrada.
  • 13:29 - 13:33
    Na estrada havia ônibus cheio de peregrinos de outros países.
  • 13:33 - 13:35
    A estrada fazia uma curva para a direita,
  • 13:35 - 13:36
    e esperamos para que pudéssemos atravessar.
  • 13:36 - 13:41
    Mas levou muito tempo. Muito tempo.
  • 13:41 - 13:46
    Estava cheio de gente. Muito cheio.
  • 13:46 - 13:49
    Depois de horas, nossa água acabou.
  • 13:49 - 13:52
    Mas era um teste. Eu estou zen.
  • 13:52 - 13:53
    Eu estou calmo. Não vou ficar doido.
  • 13:53 - 13:54
    Respiro lentamente.
  • 13:54 - 13:56
    Enquanto respiro lentamente, meu pai diz,
  • 13:56 - 13:58
    "Eu não tenho mais vontade.
  • 13:58 - 14:00
    Eu não vou ficar aqui parado, não sou doido.
  • 14:00 - 14:01
    Isto não vai dar certo,"
  • 14:01 - 14:03
    "Pai, por que isso? Estamos quase lá.
  • 14:03 - 14:05
    Vamos juntos apedrejar o diabo."
  • 14:05 - 14:07
    "Não, não, não.
  • 14:07 - 14:08
    Você está com o celular?" "Sim, estou."
  • 14:08 - 14:10
    "Vou para um lugar mais tranquilo.
  • 14:10 - 14:13
    Quando você cruzar o portâo, você me telefona e continuamos juntos."
  • 14:13 - 14:14
    Está ótimo, beleza."
  • 14:14 - 14:17
    Ele sai daquela multidão e logo depois alguém desmaia.
  • 14:17 - 14:21
    Uma senhora. As mulheres tinham mais dificuldade por estarem cobertas.
  • 14:21 - 14:25
    E então, alguém desmaia aqui, lá, acolá,
  • 14:25 - 14:26
    E alguém grita lá do fundo:
  • 14:26 - 14:29
    Meu Deus do céu, abram caminho, ela vai morrer.
  • 14:29 - 14:32
    Isso foi o suficiente para que um hadji começasse
  • 14:32 - 14:36
    a gritar que esses filhos da puta dos árabes abrissem a porra do portão
  • 14:36 - 14:40
    porque não foi para isso que pagou 3500 euros.
  • 14:40 - 14:43
    Hadji, sabr, sabr, o que você está fazendo, pense!
  • 14:43 - 14:47
    Um hadji reage dizendo que o filho daquele tipo de mulher tinha que fechar a boca.
  • 14:47 - 14:49
    senão ele arrancaria todos os dentes dele.
  • 14:49 - 14:51
    Naquele momento as coisas começaram a ficar cinzentas.
  • 14:51 - 14:54
    Eu não conseguia mais sentir meus pés no chão
  • 14:54 - 14:56
    e comecei a imaginar as cenas
  • 14:56 - 15:02
    de 1997, 1998, 2000, 2001, 2004, 2006, 2008,
  • 15:02 - 15:04
    de hadjis com membros quebrados e ihrams ensanguentados.
  • 15:04 - 15:06
    Bem, eu sei que sou magrinho,
  • 15:06 - 15:08
    mas já fiquei uma vez em uma Ronda Punk num show,
  • 15:08 - 15:10
    conheço bem.
  • 15:10 - 15:13
    Sabia que ao meu redor estavam tiazinhas turcas.
  • 15:13 - 15:14
    Não sei o que aconteceu com as mulheres.
  • 15:14 - 15:17
    Só sei que fui parar do outro lado do portão
  • 15:17 - 15:18
    com algo pegajoso nas minhas pernas.
  • 15:18 - 15:20
    Estava em cima de alguém? Caí? Não tenho ideia.
  • 15:20 - 15:22
    Comecei a sair daquela bosta...
  • 15:22 - 15:24
    Não, eu não pensei em bosta.
  • 15:24 - 15:26
    Corri, corri, corri feito um louco.
  • 15:26 - 15:32
    Porque atrás de mim vinham 139.998 hadjis turcos.
  • 15:32 - 15:34
    Corri e então peguei meu celular
  • 15:34 - 15:37
    e eu juro, o diabo estava solto,
  • 15:37 - 15:39
    a bateria estava descarregada.
  • 15:39 - 15:42
    Perdi todo mundo: meu pai,
  • 15:42 - 15:43
    o resto dos hadjis holandeses,
  • 15:43 - 15:46
    e andei sozinho por horas, por sete quilômetros,
  • 15:46 - 15:49
    perdido, pelas estradas de terra, procurando água,
  • 15:49 - 15:52
    encontrei uma fontezinha com água Zamzam,
  • 15:52 - 15:53
    e então pensei:
  • 15:53 - 15:57
    Estive ocupado com coisas pelas quais não deveria estar.
  • 15:57 - 15:58
    Vou jogar pedras no diabo.
  • 15:58 - 16:01
    Vou me livrar dos meus defeitos, e os tenho demais
  • 16:01 - 16:04
    para nominá-los e não tenho muito tempo,
  • 16:04 - 16:05
    mas pensei: concentre-se Sadettin,
  • 16:05 - 16:07
    vai que dá, é possível.
  • 16:07 - 16:09
    Eu tenho uma bolsinha com 49 pedras.
  • 16:09 - 16:12
    Coloco-as nas minhas mãos.
  • 16:12 - 16:17
    Deste momento em diante, nunca mais mesmo --
  • 16:17 - 16:20
    quando de repente o inferno explode.
  • 16:20 - 16:23
    À minha esquerda três hadjis iranianos.
  • 16:23 - 16:25
    Barba longa e turbante.
  • 16:25 - 16:27
    Eu vejo chinelos voando.
  • 16:27 - 16:28
    E voa um banquinho
  • 16:28 - 16:30
    e graças a Deus, consegui uns minutos antes,
  • 16:30 - 16:33
    cobrir minha boca.
  • 16:33 - 16:35
    Porque eu morria de tanto rir.
  • 16:35 - 16:39
    E andei em direção ao hotel.
  • 16:39 - 16:41
    Antes de entrar no hotel,
  • 16:41 - 16:42
    entrei em uma loja.
  • 16:42 - 16:44
    Lá comprei três chocolates, três bombons,
  • 16:44 - 16:48
    uma garrafa de Meca-cola, um maço de cigarros.
  • 16:48 - 16:50
    Eu me sentei no saguão do hotel,
  • 16:50 - 16:51
    comi os chocolates e os bombons.
  • 16:51 - 16:53
    Bebi a Meca-cola de uma só vez,
  • 16:53 - 16:57
    acendi um cigarro e escutei alguém me cutucando no ombro.
  • 16:57 - 17:03
    Como foi, meu filho? Como foi?
  • 17:03 - 17:07
    Era meu pai. A calma em pessoa.
  • 17:07 - 17:09
    O apedrejamento do diabo marca a Festa do Sacrifício.
  • 17:09 - 17:11
    Eu digo "Festa do Sacrifício". Outros dizem "Festa da Matança".
  • 17:11 - 17:13
    Prefiro "Festa do Sacrifício".
  • 17:13 - 17:15
    A Festa celebra esta cena:
  • 17:15 - 17:18
    a história de Abraão que é colocado em teste mais uma vez.
  • 17:18 - 17:21
    Deus ordena que seu filho seja sacrificado.
  • 17:21 - 17:24
    Na Bíblia é Isaac, no Corão é Ismael.
  • 17:24 - 17:26
    Vamos dizer que é Ismael.
  • 17:26 - 17:29
    Mas naquele momento supremo,
  • 17:29 - 17:31
    um anjo desce do céu.
  • 17:31 - 17:33
    Aponta um carneiro a Abraão
  • 17:33 - 17:35
    que está a direita na pintura, com seus chifres
  • 17:35 - 17:37
    presos no arbusto.
  • 17:37 - 17:40
    A Festa do Sacrifício é
  • 17:40 - 17:42
    a lembrança para que os animais sejam mortos
  • 17:42 - 17:45
    e não nossas crianças.
  • 17:45 - 17:49
    Eu ofertei uma ovelha.
  • 17:49 - 17:51
    Verdade. Eu fiquei com a nota.
  • 17:51 - 17:55
    Verdade? Claro. Você pode ver?
  • 17:55 - 17:58
    Boa vista. Lá está 410, não é?
  • 17:58 - 18:02
    Pode pegar. Diz 410, não é? 410 rial.
  • 18:02 - 18:05
    Em moeda saudita. Uns R$ 220,00.
  • 18:05 - 18:08
    R$ 220,00 custou-me uma ovelha, para ser abatida,
  • 18:08 - 18:11
    cortada em pedacinhos, e enviada pelo mundo afora
  • 18:11 - 18:12
    para os pobres e necessitados.
  • 18:12 - 18:15
    Eu não vi a ovelha.
  • 18:15 - 18:18
    Não dá. São 5,5 milhões que querem estar lá.
  • 18:18 - 18:20
    Açougues têm uma capacidade máxima.
  • 18:20 - 18:22
    A nota é a única prova da ovelha
  • 18:22 - 18:27
    e por isso quero de volta.
  • 18:27 - 18:29
    A Festa do Sacrifício também significa que seu cabelo pode ser cortado
  • 18:29 - 18:32
    como sinal literal de transformação.
  • 18:32 - 18:34
    Além disso você deixa um pedacinho seu
  • 18:34 - 18:37
    no local sagrado.
  • 18:37 - 18:39
    Apenas os homens cortam os cabelos.
  • 18:39 - 18:42
    5,5 milhões de pessoas, 60% homens, 80% desses vão ficar careca.
  • 18:42 - 18:45
    São 2,4 milhões de homens.
  • 18:45 - 18:48
    Acontece em todo lugar, isso de ficar careca.
  • 18:48 - 18:50
    No fim as estradas de Meca
  • 18:50 - 18:53
    ficam cheias de cabelo de homem por três dias.
  • 18:53 - 18:56
    Você precisa limpar seus chinelos muito bem,
  • 18:56 - 18:59
    antes de entrar no quarto do hotel.
  • 18:59 - 19:05
    Este é o Satã.
  • 19:07 - 19:10
    Não é bem ele, é um símbolo.
  • 19:10 - 19:13
    Aqui você joga as pedras por três dias.
  • 19:13 - 19:16
    Vamos pela última vez a Masjid al-Haram.
  • 19:16 - 19:17
    Fazemos um tawaaf de despedida.
  • 19:17 - 19:20
    É a última coisa que fazemos em Meca.
  • 19:20 - 19:23
    Por fim, vamos a Medina
  • 19:23 - 19:27
    para visitar a mesquita e a sepultura do profeta
  • 19:27 - 19:29
    de Masjid an-Nabawi, a mesquita do profeta,
  • 19:29 - 19:32
    que foi construída ao redor da sepultura de Maomé.
  • 19:32 - 19:34
    Nós saudamos a sepultura.
  • 19:34 - 19:38
    Saudar e não rezar, isso não pode.
  • 19:38 - 19:40
    Isso é sherk, idolatria.
  • 19:40 - 19:44
    Maomé era um homem simples, apenas saudamos.
  • 19:44 - 19:47
    Você compra 7 quilos de tâmaras,
  • 19:47 - 19:50
    coloca 10 litros de água Zamzam em um galão,
  • 19:50 - 19:52
    compra um despertador para saber a hora de rezar
  • 19:52 - 19:56
    e o alarme é a chamada para oração.
  • 19:56 - 19:57
    Isso você compra para sua mãe.
  • 19:57 - 20:01
    Entra no avião em Medina, uma escala em Istambul.
  • 20:01 - 20:03
    Você aterrissa em Amsterdã.
  • 20:03 - 20:07
    Há milhares de turcos felizes.
  • 20:07 - 20:08
    Há flores.
  • 20:08 - 20:11
    Há aplausos. Masha Alá.
  • 20:11 - 20:14
    Você fez o hadj.
  • 20:14 - 20:17
    (Aplausos)
Title:
TEDxFlandersSalon - Sadettin Kirmiziyuz - Hadj, uma história do caminho sagrado
Description:

Sadettin Kirmiziyüz (Zutphen, 1982) se formou em 2007 como ator pela Academia de Teatro de Maastricht. Kirmiziyüz nasceu e cresceu em Zutphen, mas é fascinado pelo fato de ser filho de imigrantes. Em novembro de 2010, Sadettin Kirmiziyüz fez a grande viagem de sua vida. Junto com seu pai viajou a Meca para a peregrinação, a Hadj, para continuar uma tradição familiar. Seu pai, como antecessor nesse ritual antigo, levou-o como aprendiz. Marcado por essa experiência, Sadettin Kirmiziyüz faz uma apresentação sobre pais e filhos, crentes e descrentes, Abraão, Isaque, Maomé, Deus e Alá. Uma história do caminho sagrado onde tudo pode acontecer.
TEDxFlandersSalon 21 de maio de 2012

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Video Language:
Dutch
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
20:23

Portuguese, Brazilian subtitles

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