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Estamos vendo uma pintura
no Museu de Arte Moderna,
de Ernst Ludwig Kirchner.
Esta é Cena de Rua, Dresden de 1908.
Kirchen é conhecido como
um artista expressionista.
Ele é classificado assim.
Ele faria parte de um grupo
chamado Die Brücke.
Isso, A Ponte.
A ponte, como se denominavam.
O que era a ponte?
Era uma ponte de onde pra onde?
Do passado ao futuro?
Sim, do passado ao futuro,
mas é uma referência direta a Nietzsche.
Mesmo?
- Eu não sabia disso.
- Nem eu.
Mas é mais interessante.
Assim Falou Zaratustra.
A ponte da civilização
até Uberwanch,
cruzar a ponte é uma jornada
de auto-descoberta,
de autorrealização pessoal.
Havia tantos artistas alemães
e artesãos que se interessavam
por Nietzsche nesta
época, não é?
Obcecados seria uma palavra
melhor.
É verdade.
O que o Nietzsche tinha?
Bem, ele queria desfazer
as idéias de moralidade que confinavam
tanto a cultura,
em toda a Europa, mas principalmente
na Alemanha.
Acredito que os jovens artistas,
Kirchen não tinha nem 30 anos na época,
eram todos bem jovens,
e se interessavam em renovação
e no novo e...
A Revolução Industrial da Alemanha
foi tardia, não é?
Sim.
Havia vária mudanças acontecendo
num curto período de tempo.
No fim do século XIX,
tentaram alcançar a Inglaterra e a França,
e se empenharam para isso.
E houve um crescimento bem rápido,
mas havia vários hábitos culturais
de que se esforçaram para escapar
e Nietsche foi a influência e inspiração
pois ele propôs vários modos
de se libertar
da reclusão e do que era adequado.
Sem responsabilizar
só o indivíduo.
Para que a pessoa não tornasse
acurada e reprimida.
Mesmo nesta pintura,
há um certo isolamento
entre as figuras, não há?
Com certeza.
Apesar da multidão
e da cena densa,
na verdade esta é uma pintura bem deserta.
Você gosta desta pintura.
Sim, adoro esta pintura.
E eu nunca gostei.
Eu adoro esta pintura. (risos)
Então quero ouvir a opinião
das duas.
Porque você não gosta dela?
Parece que há um homem vendo
as mulheres
na rua e eu sei que estão...
Não sei, acho que pra mim
ele não conseguiu ir além
das idéias do século XIX
ir além da pintura de Munch
"Rua de Karl Johan".
Exato, de 1892.
O interesse em angústia psicológica
e a alienação do mundo moderno
e o uso de cores e pinceladas
para descrever estes aspectos
Vindo de um artista simbolista,
eu gostei muito.
E os alemães também.
Exato.
Isso o tornou um herói.
E aí quando vejo esta tela
e as cores ficam mais extravagantes
e difíceis,
a composição fica um pouco desarticulada,
e a pincelada mais aberta,
não entendo o que isto traz de novo.
Traz um certo desconforto para mim,
no jeito que ele olha para a mulheres.
Foram a cor e a extravagância
que me atraíram.
Adoro a distorção.
Adoro o verde, o laranja.
Gostei do contorno laranja
ao redor do chapéu.
O contorno brilha.
Adoro olhar pra isso.
Parece néon.
Se olhar de novo para toda a composição,
adoro o fato de que as coisas se destacam
em momentos diferentes.
Acho que ela retrata o olhar,
o voyeurismo e o olhar masculino.
Se olhar para o lado direito da pintura
adoro o fato de ele estar meio cortado,
e de fora da composição.
De'Gaulle fez o mesmo em 1872.
Pra mim, esta pintura parece retratar
o isolamento e a angústia alemã.
O que você disse sobre De'Gaulle
foi bem interessante
porque de certa forma
a França passava pela mesma situação
quando De'Gaulle pintava
e a Alemanha foi um pouco depois,
mas isto não torna
a tela menos autêntica,
uma expressão autêntica
daquele momento.
Não estou dizendo
que são a mesma coisa,
mas as alienações industrial
e urbana são aspectos importantes
no trabalho de ambos os pintores.
Fica claro que a obra
é do século XX.
Ele aprendeu
e criou liberdades
do pós-Impressionismo
e de outros artistas.
Lembra o Fauvismo.
Exatamente.
Só a coloração, pra mim, é um aspecto
que a torna típica do início do século XX.
Mas não retrata a beleza do Fauvismo.
Não.
É bem agressiva.
Eu gosto disso.
Em O Café à Noite, Van Gogh queria
dar ao café
uma sensação de escuridão e tristeza
com o vermelho e o verde.
Foi o que Van Gogh disse
uns 20 or 30 anos antes.
Ele usou uma cor rosa horrível
na pintura.
Talvez a força da pintura
está exatamente
no que você não gosta,
que é o uso da mulher como assunto.
Bem, sei que ele está criando imagens
de prostitutas na rua
e acho que saber isso,
definiu o meu ver da pintura.
Me deixa bem preocupada com o jeito
que os historiadores modernos
veêm estas imagens.
Acho que, as cenas,
as cenas de prostituta vieram
cinco anos depois.
Ele estava em Berlin,
não é?
Ele estava em Berlin
e em Potsdam ou Platts e Friedrichshafen,
os principais centros de cidade
onde as mulheres...
Era bem mais vibrante e as mulheres
com certeza eram o foco
do olhar masculino.
Há vários homens rodeando
as mulheres.
Acho estas pinturas menos interessantes.
Mas só de ver
a cor e a composição,
por alguma razão,
eu sei que as pessoas preferem
estas pinturas.
Seu estilo foi aperfeiçoado,
e ele está mais maduro como artista.
Eu gosto do fato de ser mais bruto.
O Kirchen realmente foca num envolvimento
autêntico e direto,
a vivência da cidade,
o elétrico, o movimento.
Um certo deslocamento constante,
de mudança,
como se todos os vazios,
esta parte rosa maravilhosa,
estivessem constantemente mudando
e deslocando
junto com as figuras que definem
este espaço.
Acho que ele quer
tentar algo novo.
Poderíamos considerar as mulheres
com simpatia de certa forma,
talvez se não interpretássemos a tela
do mesmo modo das imagens
posteriores das prostitutas na rua?
Ela olha em nossa direção.
Ela está iluminada pelas luzes da cidade.
Quando você mencionou néon,
eu senti isso,
estes tipos de luzes, tavez na hora
do anoitecer da cidade.
Ela olha em nossa direção.
Bem, sinceramente não me parece
que sejam prostitutas.
Sim, estou dizendo que são burguesas,
mas talvez haja um aspecto
simpático nela,
se não a olharmos pelas lentes
das imagens posteriores.
Eu acho que tem sim.
Pra mim, parece que são figuras isoladas
e é isso que me atrai nelas.
Como se fosse um teatro,
se olhar para o lado,
há uma figura como se fosse uma coluna,
de figura masculina,
sustentando a pintura,
e que chama a atenção,
ele está bem ali,
entre você e as figuras femininas.
Depois tudo parece recuar para trás
numa diagonal para a esquerda.
Tem uma garota no centro da cena.
O que torna a pintura teatral?
A iluminação e o jeito que as figuras
estão dispostas.
Isto poderia ser quase um holofote
vindo de baixo
O que eu gosto é que apesar
de ser um cidade
e de haver um vestígio da linha do bonde,
não há arquitetura.
Todo o espaço é limitado
pela ocupação
das figuras ou por sua ocupação
no espaço.
De certo modo, a cidade é delimitada
pelas pessoas,
delimitada pelo próprio espaço formado
pela multidão mutante,
o que acho uma idéia bem interessante.
Ele não usa construções,
ou cruzamentos.
Ele usa pessoas para delimitar o espaço
e de certo modo, constrói uma cidade
feita de pessoas.
Feita de uma massa mutante.
Esta é Koenigstrasse em Dresden,
que é a principal via de compras
e tem muito trânsito
e movimento
e com certeza faz parte
de uma rua muito conhecida
de uma área muito conhecida
e muito povoada.
Na segunda metade do século XIX
quando os artistas pintavam cenas
como De'Gaulle,
porque me parece que De'Gaulle
o inspira,
mas há uma percepção da arquitetura
e do local.
Nada aqui é estável.
Tudo será diferente em um instante
e há um aspecto maravilhoso nisso.
Eu também gosto só de olhar
para a garotinha e seu chapéu grande
e sua mão feia, que parece uma garra.
Parece que está segurando um brinquedo.
Ou talvez flores.
Ou flores, ou alguma coisa,
mas na pintura parece assustador.
Sim. E também o jeito que suas pernas
estão ligeiramente esticadas parece
bem desajeitado.
Seu cabelo está escorrendo
no lado de seu rosto.
Isso é um pouco deselegante.
Na verdade por toda a pintura,
há uma tensão interessante entre
o esforço e elegância do vestido
e a representação agressiva
e desajeitada.
Esta tensão maravilhosa vai e volta.
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[Legendado por Sophia Bento]